Esporte é um direito da criança e do adolescente e deve ser promovido para todos, sem seletividade.
Lançado em 1988, em Genebra, e relançado no congresso de Panathlon em Avignone (1996) a Carta dos Direitos da Criança no Esporte apresenta onze itens assim distribuídos:
1 – Direito de praticar esporte;2 – Direito de se divertir e de jogar;3 – Direito de usufruir de um ambiente sadio;4 – Direito de ser tratado com dignidade;5 – Direito de ser rodeado e treinado por pessoas competentes;6 – Direito de seguir treinamentos apropriados aos ritmos individuais;7 – Direito de competir com jovens que possuem as mesmas possibilidades de sucesso;8 – Direito de participar de competições apropriadas;9 – Direito de praticar o próprio esporte com absoluta confiança;10 – Direito de tempos de repouso;11 – Direito de não ser um campeão.
Respeitar o ser em desenvolvimento no sentido de garantir uma educação esportiva de qualidade que possa oferecer o aprendizado do gesto esportivo combinado com a possibilidade de gosto pelo esporte é um eixo que perpassa toda a carta. Da mesma forma, ampliar experiências motoras e sociais dos grupos, a fim de estabelecer “consciências” dos direitos que possam ser introjetadas e vividas democraticamente.Tratar de direitos da criança no esporte implica o questionamento da concepção e da prática esportiva a ser conduzida. Variando de lugar para lugar, mas com um eixo comum, os direitos podem se tornar inexpressivos e sem utilidade caso sejam apenas vistos e não vividos, isto é, caso não ocorra uma efetiva manifestação sobre eles.
PANATHLON
UNESCO
1- Direito de praticar esporte
1- Diereito fundamental de todos
2- Dierito de diversão e brincadeira
2- Educação permanente
3- Benefício de ambiente sadio
3- Necessidades dos indivíduos
4- Tratamento com dignidade
4- Qualificação docente
5- Treinamento por pessoas qualificadas
5- Equipamentos e materiais
6- treinamento adequado
6- Investigação e avaliação
7- Igualdade nas possibilidades
7- Defesa de valores éticos
8- Competições adequadas
8- Informação e Documentação
9- Repouso
9- Comunicação Social
10- Direito de não ser campeão
10- Intituições Nacional
11- Cooperação Internacional
A partir de uma compreensão unificada e avançada sobre direitos no esporte escolar, percebemos que ambas as instituições enfatizam as competições esportivas em detrimento das aulas de esporte para todos. Além disso, pautam seu discurso abstraindo a escola do universo de possibilidades pedagógicas do esporte.No Brasil, dominantemente o esporte educacional ocorre no interior da escola e não fora dela. Sabemos das dificuldades dos professores de Educação Física na organização de horários de quadra e turmas para a prática esportiva e isso reforça o argumento de que a escola deve ser um espaço privilegiado de atuação e ocupação do esporte escolar. Em ambos os documentos, a tônica parece estar fora da escola, concebendo uma criança idealizada, isto é, uma criança que, em tese, não enfrentaria problemas na família, na escola e na sociedade. No geral, não temos nada contra o esforço de Instituições que proclamam direitos para todos no esporte. O que não podemos deixar de frisar são as generalidades das cartas, palavras que se soltam no vazio e não se relacionam com a realidade miserável da maioria das escolas no Brasil.Tentando inverter tal lógica, apresentamos a primeira versão da Carta Brasileira do Esporte Escolar – objeto de debate do Seminário Nacional Esporte Escolar e Inclusão Social – realizado em dezembro de 2003 na Universidade de Brasília.Levando em consideração a diversidade e complexidade brasileira, bem como os objetivos do Programa Segundo Tempo, a perspectiva amplia determinadas noções de esporte e sugere a participação de todos na reflexão e ação sobre os mecanismos necessários à efetivação dos direitos no esporte escolar.
A Carta Brasileirado Esporte Escolar
Ao término do estudo desta seção, você deverá ser capaz de:• Compreender que existe desde a década de 80 um debate acadêmico profissional em forma de cartas, manifestos, confrontos e embates político-ideológicos na área de Educação Física;• Compreender e ser capaz de explicar as diferenças entre as posturas assumidas por diferentes grupos e concepções nesse debate.
Como a Carta Brasileira do Esporte Escolar trata as diferenças entre a Educação Física e o esporte? Em sua opinião, quais as inovações desta carta?
Por outro lado, a vivência dos direitos para as crianças devem constituir, na prática, as possibilidades de atingir a sensibilidade, o gosto pela vida, isto é, o direito de ser feliz.
Segundo Ruth Rocha (2002)
“Criança tem que ter nome, criança tem que ter lar, ter saúde e não ter fome, ter segurança e estudar. Não é questão de querer, nem questão de concordar, os direitos das crianças todos têm de respeitar (...) Tem direito à atenção, direito de não ter medos, direito a livros e a pão, direito de ter brinquedos (...) Carrinho, jogos, bonecas, montar um jogo de armar, amarelinha, petecas e uma corda de pular (...) Uma caminha macia, uma canção de ninar, uma história bem bonita, então, dormir e sonhar. Embora eu não seja rei, decreto neste país, que toda criança tem o direito de ser feliz."
1.6.1 As Cartas Brasileiras de Educação Física
Na seqüência apresentamos uma síntese das Cartas Brasileiras de Educação Física com a intenção de problematizar o debate sobre o esporte escolar como uma política a ser documentada e os diferentes papéis por ele estabelecidos.As cartas devem ser consideradas no tempo em que foram escritas e, assim, guardadas as características conjunturais e políticas dos diferentes momentos. Seguindo a compreensão da problemática dos direitos, citada anteriormente, as cartas brasileiras orientam-se pelo modelo de análise global do processo, conhecimento e realidade da Educação Física no país.É necessário, portanto, para os propósitos do esporte escolar, descartar as formulações mais genéricas sobre Educação Física e atentar para as especificidades que façam relação com o trabalho docente e as práticas esportivas de crianças e adolescentes.Após uma apresentação resumida de cada carta, segue um comentário crítico que pode e deve ser também interpretado por você de acordo com sua experiência profissional e conhecimento acadêmico.
Carta de Belo Horizonte – julho de 1984 - Carta 01
Carta de Carpina – 12 a 14 de março de 1986 - Carta 02
Carta de Sergipe – 15 de dezembro de 1994 - Carta 03
Carta do Confef – agosto de 2000 - Carta 04
1.6.2 Comentários e reflexões sobre as Cartas Brasileiras deEducação Física
São nítidas as diferenças e semelhanças apresentadas nas cartas. A seqüência cronológica destas produções (1984 – 1986 – 1994 – 2000) indica, nos contextos das conjunturas específicas, as mudanças internas da Educação Física brasileira.Após a ditadura militar, todos foram unânimes em promover o direito à Educação Física e esporte de qualidade. Até mesmo no período ditatorial, tal direito era declarado com letras maiúsculas.
Diversas intenções podem ser extraídas destes documentos:• necessidade de dar visibilidade a uma área com baixo grau de densidade científica; • necessidade de combater politicamente grupos antagônicos; • tentativas de superar a prática tecnicista na formação dos professores, pois tal formato atrapalhava as intenções de abertura do mercado na área; • promoção e valorização de tecnologias em desenvolvimento; • informações e documentações que, em grande parte do período citado, eram extremamente restritas a grupos fechados.
Há, no entanto, um fio condutor que atravessa o período das cartas e manifesta-se com bastante visibilidade nos dias atuais: a questão do corporativismo.
Ainda que na prática a luta travada seja pelo corpo de professores, o movimento geral das cartas se aproxima muito mais das reivindicações, obrigações, palavras de ordem e defesas apaixonadas (muitas vezes legítimas) do que de uma ofensiva estratégia organizada com um amplo conjunto de trabalhadores. A limitação apresenta-se quando apenas os aspectos econômicos são priorizados, quando apenas os aspectos reivindicatórios do jogo político são apresentados como elementos de contradição.E como se processa o engajamento e a criticidade do professor? Poderse-ia contra-argumentar e elaborar a tese da estrutura política vigente que oprimia o conjunto das classes populares e, entre elas a da Educação Física. Superar as concepções mecanicistas e corporativistas é um desafio para todos aqueles que desejam mudar a Educação Física e o esporte por dentro, pela via efetivamente pedagógica-política.Mas a força educacional das atividades docentes na escola pode começar a fazer sentido, desde os pequenos jogos ao esporte de competição. Isso, é claro, vai depender do planejamento das atividades e atitudes, dos conteúdos, métodos e avaliação dos professores, o que implica em bons salários e, então, estamos de volta à questão do corporativismo. Por outro lado, a unidade se constrói na luta, na diversidade de opiniões e na experimentação de novas possibilidades.As cartas registraram e captaram a maior parte dos anseios da área de Educação Física, mas mesmo assim é necessário reafirmar que esse movimento culminou, ao mesmo tempo, com uma ruptura na eleição de 2002, e uma continuidade crescente, pois todos os elementos concretos das cartas, suas manifestações, pleitos e explicações continuam vivos.
Usamos a palavra qualidade sem pensar muito em seu significado.Para você, o que é qualidade? Como ela se expressa na educação e no ensino do esporte?
Opinar e filosofar sobre o conteúdo das cartas deve ser combinado com um aprofundamento conceitual dos temas e abertura de polêmica justa quanto à programática a ser instalada em cada unidade escolar, em cada núcleo de esporte, para que se concretize o discurso e se efetive a mudança.Com esse espírito, podemos rumar para a ampliação do horizonte teórico-político e, na prática, desenhar novas possibilidades de intervenção criativa. De qualquer forma, concordando ou discordando do conteúdo e das mensagens das cartas, registra-se o empenho daqueles que as escreveram e/ou contribuíram na intenção de melhorar a área de Educação Física. Quem realmente se comprometeu com a construção de mudanças merece ser parabenizado.
Um outro ponto importante a ser sublinhado no conjunto das cartas refere-se ao conceito de qualidade – se de um lado trata-se de uma justa reivindicação dos trabalhadores, de outro apresenta-se como serviço prestado, como mercadoria a ser trocada; em última análise, remete àcoisificação do sujeito.
Importa registrar que a verdadeira qualidade deve ser social e socializada com todos. A discussão conceitual sobre qualidade pode ser resumidamente apresentada sob dois prismas: de um lado, a empresa capitalista que almeja lucros através de política econômica favorável aos empresários e amplamente desfavorável aos trabalhadores. Tal organização econômica da atividade produtiva e de serviços em conjunto com a organização do trabalho requer qualidade. É a eficiência da eficácia, a rapidez da perfeição, a competitividade do competitivo, a ganância do ganancioso.De outro lado está a qualidade social dos trabalhadores, radicalmente diferente da anterior. Produz-se qualidade a partir da construção coletiva e popular, da arte e da estética, da educação voltada para o humano, ou seja, não meramente voltada para o mercado. O conceito de qualidade tem sido vulgarmente utilizado para definir produtividade, eficiência, agilidade de relações de trabalho e ética. Vê-se portanto, que a qualidade depende de quem olha, da concepção que se adota para enquadrá-la nos objetivos perseguidos.Na tentativa de estabelecer os principais significados das cartas hoje, para a política da Educação Física e esporte em nossa sociedade, realizamos um extrato das questões básicas para os determinantes escolares:
• Atividade docente e formação acadêmica e continuada, vinculada à produção de pesquisas socialmente relevantes;• Competência pedagógica que contemple a autonomia dos alunos;• Implantação de políticas sociais no país e, principalmente no Nordeste, área carente de recursos humanos e materiais;• Participação ativa e gestão democrática nas diversas entidades e debates que os envolvidos dinamizam.
Por fim, na conceituação do Coletivo de Autores sobre a reflexão pedagógica, entendemos que não pode ser uma carta ou um conjunto de cartas, o eixo de articulação da área de Educação Física e esporte . Segundo o Coletivo, a reflexão pedagógica é diagnóstica, judicativa e teleológica, isto é, constatamos os dados da realidade, julgamos tais dados a partir de uma determinada ética e apontamos a direção, o alvo aonde queremos chegar (Metodologia do ensino de Educação Física, 1992, p. 25). Podemos traçar o paralelo entre tal reflexão e o saldo das cartas brasileiras de Educação Física. Estamos rigorosamente situados no conflito de perspectivas, pois já sabemos diagnosticar, julgar e objetivar. Resta aperfeiçoar tais mecanismos.
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